Há quem não seja mesmo capaz de construir nada além de frases. Essas frases soltas, mal arranjadas, nem poesia nem prosa, qualquer porcaria no meio disso, só palavrório buscando escapar de qualquer coisa palpável. No geral, as frases começam com ideias, mas para as pessoas que vivem de composições, são as ideias que começam com frases. São as palavras que se aproximam ao sabor da sonoridade e trazem ideias ainda não pensadas.
segunda-feira, 28 de dezembro de 2015
sexta-feira, 27 de novembro de 2015
De passagem
Há pessoas que entram e saem da vida das outras assim como quem não quer nada. Como um gato de passos leves, que não estava ali há um segundo, mas agora está e é como se estivesse ali sempre, tanta é a naturalidade em se instalar onde está. É dessa mesma forma que gente assim desaparece, muitas vezes carregando as lembranças de sua passagem. Vai e a lembrança é feita de imagens etéreas, onírica. Como se não existisse, como se nunca tivesse existido.
terça-feira, 20 de outubro de 2015
عيونك الصيف
Toda paixão que sinto, querido, quando olho nos seus olhos, volta como se nunca tivesse me deixado... Talvez porque, de fato, nunca me deixou.
Às vezes ela adormece no meio da raiva, às vezes esqueço que ela existe, mas então seus olhos, a luz de seus olhos...
domingo, 11 de outubro de 2015
Bruta flor do querer
Mesmo se meus cabelos tivessem cheiro de tangerina e eu tivesse hálito de maçã, nem assim seria o que você quer. E eu quero ser o que você quer, quero que você me queira da mesma forma que eu quero você. E eu quero tanto! Quero como eu tinha esquecido como era querer, quero como se eu fosse uma garotinha querendo sua primeira grande paixão, quero agora sem vê-lo e quero ainda mais quando está diante dos meus olhos. E quero tanto que desejo deixar de querer e esquecer e encontrar a sanidade outra vez.
segunda-feira, 28 de setembro de 2015
Hoje
Ainda tenho a maquiagem borrada nos olhos, de ontem ainda, não me importo, apenas não me importo. Meu corpo parece vivo demais para eu me importar.
Se já é tão pouco o que temos, melhor sentir apenas, para pensar vai restar ainda muito tempo.
segunda-feira, 27 de julho de 2015
Vício
Um dia ela me olhou bem nos olhos e cantou, desafinada: "minha papoula da Índia, minha flor da Tailândia, és o que tenho de suave e me fazes tão mal". Eu tinha 13 anos e era a primeira vez que era comparada com drogas... e eu nem sabia disso. Mas eu entendia "suave" e "mal" e isso nos bastava. O porquê era que eu não conseguia entender ainda. Ela tinha a minha idade e seu olhar parecia chumbo, carregado de dor e rancor e medo. Acabou se aproximando ao perceber que eu conseguia viver em um mundo próprio e mágico que se tornava real enquanto eu falava.
Fantasia era tudo que eu oferecia porque era tudo que eu tinha. Fantasia era tudo de que ela precisava. Na minha imaginação havia campos de margaridas onde aconteciam amores perfeitos, risos, acolhimento e segurança. Mas a imaginação era minha, a magia só acontecia comigo. Depois, o desamparo. Em casa, as críticas, o olhar raivoso da mãe, a fuga constante da presença do padrasto, a realidade. Quanto a mim... eu travava minhas próprias batalhas, mas com a vantagem de ser capaz de deixar o corpo lutando enquanto minha mente voava.
Como enfrentar a realidade, quando não se tem idade nem autonomia para mudá-la? Como viver no desamor e no medo? Amor, para ela, só existia com desconfiança e raiva, uma vez que tudo terminava no desamparo. Era assim que me amava. Era por amor a mim que ela acreditava e eu nem mesmo sabia reconhecer que era amor, mas continuava oferecendo sonho: o final era um desamparo diário.
Até que um dia, seus olhos estavam inchados quando ela abriu o portão. Por trás, o olhar sempre raivoso da mãe. Então percebi que acreditar na minha fantasia já era um problema a mais: o suave que faz mal. Mas eu não tinha mais nada a oferecer.
Ainda demorou muito tempo para meu seguro mundo imaginário desmoronar. Cada pedaço era destruído na medida em que o fantástico saía da imaginação para se tornar real. A rua, as pessoas reais, a terra, o calor e a luz do sol, o cheiro da chuva, todas as coisas belas que meus sentidos apreendem, o aqui e o agora... Quando viver passou a ser possível, a fantasia não precisou mais ficar presa na imaginação e nas palavras, então deixou de ser fuga para ser oportunidade. Já não posso oferecê-la porque já não é minha, mas sei onde encontrá-la. Será que ajuda?
Ainda demorou muito tempo para meu seguro mundo imaginário desmoronar. Cada pedaço era destruído na medida em que o fantástico saía da imaginação para se tornar real. A rua, as pessoas reais, a terra, o calor e a luz do sol, o cheiro da chuva, todas as coisas belas que meus sentidos apreendem, o aqui e o agora... Quando viver passou a ser possível, a fantasia não precisou mais ficar presa na imaginação e nas palavras, então deixou de ser fuga para ser oportunidade. Já não posso oferecê-la porque já não é minha, mas sei onde encontrá-la. Será que ajuda?
quinta-feira, 23 de julho de 2015
Vôo livre
Levanto vôo, passo por cima do que muitos consideram como fracasso. Se fracassei, foi em não ser tão livre como eu sempre quis ser. Se fracassei, foi em não ser racional como eu acreditava ser. Só que, olha, ter fracassado não é motivo para desistir. Às vezes parece que esperavam que eu me resignasse ou me matasse. Não. Minha resposta é "não" quantas vezes forem necessárias. Não! Continuo voando para longe, bem aqui em cima. Às vezes sinto minhas asas pesarem, pouso no galho de uma árvore e observo enquanto recupero meu fôlego. Ser livre exige muito esforço.
sábado, 18 de julho de 2015
Palavras
Prima a sabedoria extremo oriental pelo silêncio. Já a tradição semita se constrói na palavra: no início havia o verbo. E eu, que tenho o coração mais próximo dos antigos nômades do deserto, só sei trabalhar o mundo dessa forma: com palavras.
Elas escorrem pelos meus dedos e, unidas em sentenças, colocam ordem em fios emaranhados de pensamentos e sentimentos e lembranças. Ou: posso ouvi-las em minha própria voz enquanto elas se desfazem no ar. Uma após a outra... e muito do que eu não era capaz de entender torna-se compreensível.
No entanto, o silêncio tem o seu valor, naturalmente! Porque há palavras ditas somente para ferir e essas deveríamos silenciar. Mas, estranhamente, temos mais o costume de calar as palavras belas quando são verdadeiras. Por quê? As palavras belas e verdadeiras são a negação das armaduras: elas expõem o nosso melhor ao ataque ou ao desprezo e, muitas vezes, nosso melhor é bastante frágil. Mas não me importo muito com isso: o que um eventual ataque conseguir destruir, eu reconstruo... com novas e mais belas palavras.
quinta-feira, 16 de julho de 2015
Desiludindo III
Escrevo como se você fosse a mocinha e eu, o cavalheiro da rosa. Falo da doçura dos seus olhos, da delicadeza de suas palavras e de toda a minha corte fracassada. Mas minhas confissões estão cheias de mágoa de mulher empoderada ao saber que julgam-na viril e indigna de amor. Julgam e julgam errado esses juízes... você, o pior deles. Não entendem quão mulher eu sou! Mulher e toda mulher. E acho até que, na verdade, entendem sim e é isso o que assusta: minha feminilidade não se subjuga, querido.
Desiludindo II
Era delicado e até puro o meu amor. Nasceu de uma frase doce e espontânea - será? Ou apenas quero entender que sim? -, agora agoniza no seu silêncio, no seu... desprezo? - e eu queria tanto acreditar que não...
Mas era puro como tudo o que sinto. Sim! Também o meu desejo tão natural, tão instintivo, tão animalesco, também ele era puro. Porque não há perversidade nas coisas naturais, é o nosso racionalismo que corrompe tudo! E agora estão morrendo. Deixo morrer. Por mais que eu escreva a respeito, deixo morrer: era tudo bonito e delicado demais para a gente corromper.
Desiludindo I
Desisto, depois espero, jogo as runas, sonho por um minuto, acabo por desistir de novo e de vez. Que esperança eu poderia ter? E para quê? Apenas querer não é o suficiente para ser querida. E, mesmo se eu pudesse, de que adiantaria um amor obrigado? Não. Não quero um amor obrigado, nem falsas esperanças, nem projeções de comédias românticas. Afinal, bem sei que vou virar as costas e você não vai me chamar de volta.
segunda-feira, 22 de junho de 2015
حلو
Era "adeus" e era definitivo. Ainda é. Mas a doçura de seus olhos desfaz tudo que parece definido. A doçura de seus olhos me desarma e eu fico indefesa, derrotada diante de si. Todavia... entendo que nosso "adeus" seja definitivo e não quero mais descobrir o que a doçura dissimulada de seus olhos desanda a dizer.
domingo, 7 de junho de 2015
sexta-feira, 5 de junho de 2015
Presente
Eu disse que era para ir embora. Foi mesmo. E que não volte, e que não volte! Se o passado não pode voltar e o futuro é apenas "talvez", que o presente seja pertinente, possível, palpável.
quinta-feira, 14 de maio de 2015
Regen
Es regnet. Es regnet kalt und viel auf meine Gefühle, so dass ich nicht mehr weiß, wie ich mich trocken stellen kann.
domingo, 10 de maio de 2015
terça-feira, 5 de maio de 2015
Mas não
Se eu tivesse tido chance, teria mostrado um mundo de delícias. Se você tivesse deixado, nossos corpos teriam se acertado, se aceitado, se acostumado. Mas não. Tudo se desfez em promessa subentendida, tão mais fácil de ser quebrada. Se nós tivéssemos nos permitido... mas não. Não mais. Nunca mais.
sexta-feira, 1 de maio de 2015
Ponownie
Não há como evitar de cometer o mesmo erro, outra vez, outra vez e outra vez. Só sou capaz de errar em nome do que sinto, uma vez que não sou capaz de deixar de sentir.
domingo, 26 de abril de 2015
Paráfrase
Falam-me maravilhas do silêncio, penso que querem me matar: se silencio, sufoco o sujeito que sou, o verbo que me liberta, o complemento que dá sentido à vida.
sexta-feira, 24 de abril de 2015
Pitonisa
Às vezes, para mim, textos são oráculos. Pego um livro aleatório e abro uma página aleatória: o universo claramente transmite sua mensagem. Um consolo, um conselho, um soco no estômago. Da poesia ou da prosa tiro respostas e, em alguns dias, elas também me chegam sem que eu tenha perguntado.
segunda-feira, 20 de abril de 2015
Tempus transit
Era março e a neve já tinha derretido, mas ainda fazia frio. Dentro de mim havia sol e, não importa quão rigoroso tivesse sido o inverno, esse sol interno nunca deixou de queimar. Quanto a ele, sei que estava protegido na geada até eu chegar. E eu cheguei. Comigo, a primavera daquele ano e de nossas vidas.
Eu tinha completado 23. Ele, 22 - uma semana e meia antes da minha partida. E, nessa semana em que ele completa 30, ficamos os dois espantados com esse tempo que tem muita muita pressa de passar.
O tempo e sua espantosa relatividade... Tantas lembranças daqueles dois meses, mais outras tantas daquele outro ano, às vezes parecem ter sido um terço da minha vida. Mas foram só dois meses, foi só um ano. Muito mais do que relativo, o tempo é afetivo.
domingo, 19 de abril de 2015
16 de abril
Sou dessas e me apaixono por pequenos defeitos: são eles - e nunca as perfeições - que a memória evoca para formar imagens amadas quando fecho os olhos. Tantos e variados como um olhar de peixe morto, uma língua quase presa, uma gagueira leve, um nariz meio adunco ou meio grande demais, um vício de linguagem, uma certa aspereza nas mãos, uns dentinhos separados, um sorriso meio torto e/ou um riso que lembra um soluço. As outras pessoas podem até criticar - e criticam - esses detalhes, mas onde estaria o encanto se todos se agradassem das mesmas coisas?
quinta-feira, 16 de abril de 2015
Não cabe no metro
Tantos epigramas tenho lido, a tantos lamentos amorosos tenho me dedicado nos últimos anos, nem imaginava que pudesse sentir esses versos na pele. Do desejo e do ressentimento por sua não consumação, a recusa pelos temas elevados, as invectivas. Não tenho escrito, mas sentido e vivido com tanto ardor que valem todo o conteúdo da Biblioteca de Alexandria.
quarta-feira, 15 de abril de 2015
Nuvem
Eis-me novamente, caída de uma nuvem que jamais pareceu segura. Tantas complicações, tantas palavras, tanto peso, ela jamais seria capaz de suportar. Agora é necessário recolher o que ficou de mim, mas dessa vez são poucos pedaços: essa nuvem nunca alcançou as alturas.
terça-feira, 14 de abril de 2015
Peleja II
Estou impedida de pensar: meu pensamento é assaltado por sentimentos violentos e, assim, fico inerte diante da fúria de sensações que não entendo. Torna-se uma guerra desequilibrada - tanto quanto eu, talvez? - acabo por me sentir impotente, totalmente sem energia para lutar. Tombamos, meu pensamento e eu. Os sentimentos, esses bárbaros, destroem e pilham tudo que era meu, restando de mim apenas ruína.
segunda-feira, 13 de abril de 2015
Bruxa
Tenho queimado lentamente na fogueira, talvez para purgar os pecados que, embora não tenha cometido, estão me consumindo por tanto desejá-los.
sexta-feira, 10 de abril de 2015
Um minuto?
Aqui estou novamente: carrego meu catálogo de erros e chamo de "histórias para contar". Ofereço a quem passa... há quem finja interesse. Volto para casa e não convenci ninguém.
sábado, 4 de abril de 2015
Fuga
Quero fugir, tento loucamente fugir, desesperadamente! Vivo nessa oscilação entre querer e controlar meu querer, entre resistir e desistir enquanto a vida simplesmente passa. Às vezes parece apenas que é a vida mesma que foge enquanto apenas fico para trás.
sexta-feira, 3 de abril de 2015
Mais para massinha
Em dias perdidos como esse, ociosos e inúteis, tento não pensar em como jogo minha vida pela janela. Há mesmo sempre a necessidade de produzir? Quando então serei capaz de agir acertadamente? Seguro as peças do quebra-cabeça e observo novamente até entender onde se encaixam. Seria fácil se a vida fosse feita de peças fixas como um quebra-cabeça, mas não é, nunca vai ser! Se não encaixo rápido, elas mudam de forma e preciso começar tudo de novo...
quinta-feira, 2 de abril de 2015
Paciência
Acreditei não ser mais capaz, mas vibra aqui dentro novamente. Posso sentir no meu útero, na lembrança física da sua boca na minha, em tudo que há de mais secreto em mim. Mas tenho queimado inutilmente em uma paixão que não se consuma e mal sei como suportá-la.
quinta-feira, 26 de março de 2015
Depois
Depois eu me acalmei, como o céu que volta a ficar límpido depois da tempestade. Acaba-se a agitação, acaba-se a angústia. Respiro fundo e recomeço mais uma vez e outra e quantas vezes forem necessárias!
sexta-feira, 20 de março de 2015
Álbum
Tenho lido o livro que você me deu. Não sei como ou porque, mas tenho lido aos poucos, bem aos poucos. Quantos anos se passaram? De fato, não mudei quase nada: continuo emotiva, choro com facilidade, amo intensamente... só que agora não tenho a quem dirigir tanto amor. A você? Ao que você foi? Não mais e sempre. Agora está tudo muito diferente, até sou capaz de ler o presente do nosso último dia e de ver nossas fotos. O que aconteceu, afinal? Talvez o costume da sua falta, não sei. Talvez uma nova ferida, uma nova paixão fracassada. Não sei... O fato é que sobrevivi, posso lembrar que também foi maravilhoso. Escreveu a poeta: "ninguém na família morreu de amor./ O que foi, foi, nunca alcançou o mito."
terça-feira, 17 de março de 2015
Para frente
Acho que sim. Sim, estou pronta. O que significam esses anos todos, já não sei. Quero acreditar que não tenham sido simplesmente jogados fora porque não foram. Quem tem o direito de me julgar pelas minhas escolhas, pelo imenso amor que eu senti, pelo que perdi quando apostei tudo que tinha naquela paixão maior e mais forte do que eu? Quem poderia me julgar? Os medrosos e os infelizes talvez. Os covardes ou os amargurados somente... Já não me importo, já é passado. E agora começa um novo tempo porque eu me permito, porque simplesmente sim.
sexta-feira, 13 de março de 2015
حبي الجديد
Meu novo amor vem sinuoso em uma sonoridade que ainda aprendo a conhecer. Desses dominadores, que ninguém percebe como chega, surpreende que não estivesse sempre presente. Vem pela forma, vem pelo sentido, vem pelo ouvido. Meu novo amor se esparrama em cassidas, em versos curtos, no alifbata, da direita para esquerda, em constantes enfáticas. Ele ressoa em meu corpo em desafio e cansaço, mas abre o caminho para o novo e eu vou seguindo...
terça-feira, 10 de março de 2015
Peleja
Zero a zero, fica a impressão de que nunca mais será possível mudar esse placar. Campo alagado, falta de treino, torcida desorganizada. Zero a zero, pior do que derrota por goleada. Como jogadora e juíza, apito o fim do jogo, pego a bola do campo e saio do estádio sob a chuva fina.
sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015
Do que não se diz
Tenho me esquecido aos poucos de tudo que um dia aprendi ou quis aprender para você. Às vezes preciso de mais esforço para esquecer, quando minha boa memória me conta coisas que eu não queria mais lembrar. Outras vezes cogito lembrar, aprender mais e me aprofundar, abrir meu coração para o que há além de você e vencê-lo enfim. Penso se não foi exatamente isso que você fez: será que me venceu dentro de você ao aprender o meu idioma? Mas você não entende a minha língua - a língua que fala o meu coração - e não entenderia ainda que aprendesse todos os idiomas do mundo. A língua do meu coração reverbera por todo o meu corpo e só através dela sou capaz de me comunicar, sem mentir jamais. Sem mentir jamais. Talvez seja semelhante: de que me adiantaria aprender seu idioma, se não desejo aprender a língua que você fala? De que me adiantaria se eu me recuso a aprender a língua do jogo e do engano?
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015
Aqueles poemas de amor
Quanta insensibilidade presentear com poemas sem tê-los lido. As mais belas palavras tornam-se vazias, plenas apenas dos sentimentos da pessoa desconhecida que as escreveu. Já é o bastante quando o livro não é um presente, caso contrário, carece de cumplicidade e de intenção de oferecer os versos que lhe tocaram o coração. Mas sem tê-los lido, nada foi tocado, nenhuma emoção foi evocada, a conexão fica frouxa: quem lê estende a mão e agarra o nada, tudo é apenas forma e o único diálogo estabelecido é entre o estilo e a consciência de quem lê.
domingo, 15 de fevereiro de 2015
Robótica
Sentada na estação de metrô, olho para frente e para os lados. Praticamente todas as pessoas olham para a tela de seus celulares, jogam ou escrevem mensagens tão vazias que não sei se valeria a pena serem escritas... ou leem coisas assim. Mais uma vez, sinto-me alheia à minha espécie. Robótica. Não eu, mas a humanidade. Enquanto eu, instinto e raciocínio e sensações e intensidade, luto para não sucumbir a uma vida virtual.
sábado, 14 de fevereiro de 2015
Narciso necessário
Foi bonito de se ver. Aquela imagem de mulher, os cabelos caindo em ondas de um lado e presos do outro. Um dos pés na meia ponta, junto ao outro tal qual uma estátua de Vênus. Pura delicadeza no olhar e no meio sorriso solto, tão feminina, tão inesperadamente mulher. Foram poucos segundos, mas a maravilha tinha acontecido: eu estava diante dessa imagem refletida na barreira da estação de metrô. Eu estava diante de mim mesma, sozinha na multidão. Eu estava diante de uma mulher sem vínculos, mas apaixonada. Estava estava apaixonada por mim outra vez.
segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015
Um respiro feliz
Tenho declinado tantas vezes, desistido, deixado para depois, tantas vezes que já quase não percebia tudo quanto perdia. Quase falhei com outras pessoas com quem me importo e comigo mesma novamente. Bendito ato de responsabilidade e força de vontade! Uma saída forçada da inércia e está dado o passo seguro para o caminho que leva ao encontro ao único objetivo de estar aqui: viver!
sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015
Adorno
Mais do que nunca, os dedos da solidão apertam meu pescoço e respiro com dificuldade. Sem rumo, sem importância, sem função, sem absolutamente nada que me prenda ou que precise da minha presença, existo no mundo como artigo de luxo, quando muito um adorno capaz de ser agradável, mas totalmente desnecessária à vida de quem quer que seja, até mesmo a mim. E impressiona que um ser tão desconectado sobreviva tanto. Mais uma hora, mais um dia, mais um ano. Tive a esperança de algo grave, imagino maneiras indolores de terminar. Depois busco o consolo das palavras e o abrigo nos livros, refúgio clássico de todo aquele que a solidão apanha, mas é tudo em vão. E quando eu penso que não, enquanto atuo meu papel de adorno, é que ela me abraça com força e já não posso me livrar.
quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015
Frágil
O corpo, esse malandro, está sempre mostrando o quanto sou frágil. Daqui a pouco, já passei. Mas agora, é a dor que atesta minha efemeridade assim como a vida que pulsa nas minhas veias. A vida que tem seus dias contados, não importa o quanto eu me proteja: a vida está sempre com os dias contados.
E eu que sempre me julguei tão forte, tentando passar pela vida como um ser acima do tempo, da doença e da morte, mal sei lidar com qualquer sensação de desconforto. Minha força e saúde existem na medida da minha ilusão.
domingo, 1 de fevereiro de 2015
Agora
Como uma peça de quebra-cabeça encaixada à força no lugar errado: é assim que me sinto. Faz-me falta a segurança que nunca senti, talvez a certeza de que estou no caminho certo. É que talvez eu não esteja mesmo e pode ser que não dê tempo de algum dia estar. Só sei que o tempo passa rápido demais. Rápido demais. Rápido... e o futuro brilhante deixa de ser futuro e parece cada vez mais fosco. Não vale mais a pena esperar pelo futuro e culpar o passado. Só me resta sobreviver ao presente, ainda que desconsertado.
sábado, 31 de janeiro de 2015
Perfil
Muitas vezes tenho me perdido, outras tantas não tenho me perdoado. Mas sei que preciso continuar tentando. Entender a mim mesma, descobrir e aceitar: tudo isso cabe no perdão.
Tenho procurado me olhar de frente. Olhar nos meus olhos com a mesma insistência com que encaro qualquer outra pessoa. Já meu perfil, prefiro evitar. Arrogante e esteticamente feio, faço um esforço para desculpar mais essa imperfeição. Mas meu olhar estrábico também se dirige para dentro: talvez eu ainda entenda a intensa busca pela vida que me faz flertar com a morte. Talvez o mais intenso seja mesmo o último pulsar.
domingo, 25 de janeiro de 2015
Meu papel de trouxa
Não sei para que compro papel, mais papel, sempre papel, último fruto de uma árvore morta assassinada para alimentar histórias, compromissos, rabiscos, declinações e conjugações. O que acho que vou salvar? E para quê?
sexta-feira, 23 de janeiro de 2015
Peek-a-boo
Talvez seja um jogo e começo a gostar de jogar. Espia e disfarça. Disfarço e sustento o olhar. E para sua cara feia há meu sorriso debochado.
Mas é que continuo a mesma, só que agora jogo melhor.
Mas é que continuo a mesma, só que agora jogo melhor.
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